sexta-feira, 22 de julho de 2022

JORNALISMO LGBTQIA+: O JORNAL LAMPIÃO DA ESQUINA COMO OBJETO DE RESISTÊNCIA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

ESCOLA DE CIÊNCIAS DA INFORMAÇÃO
DISCIPLINA METODOLOGIA HISTÓRICA EM MUSEUS

Alexsandro Claudio
Daniel Augusto Volante Daldegan de Paula
Ingrid Gabriele Fernandes Fonseca
Lara do Prado Cunha
Vitor Luiz Medeiros de Souza

JORNALISMO LGBTQIA+: O JORNAL LAMPIÃO DA ESQUINA COMO OBJETO DE RESISTÊNCIA

Flávia Péret, pesquisadora sobre a Imprensa Gay no Brasil, responde:

No mês de junho de 2022 foi realizada uma entrevista online via whatsapp com Flávia Péret, durante a entrevista perguntamos sobre a pesquisa que Peret fez para seu livro Imprensa Gay no Brasil. A pergunta feita era sobre o porquê do Jornal Lampião da Esquina ter sido considerado tão relevante, a resposta foi: “O que destacava o Lampião eram os Conteúdo das reportagens. Antes do Lampião o que existiam eram iniciativas mais “leves”  onde a comunidade gay falava mais sobre eventos sociais e fofocas, muitas vezes reforçando estereótipos do homem gay. O Lampião era um jornal inteiro de muitas páginas e conteúdos de matérias de pesos com pesquisas consistentes. Faziam reportagens complexas, abordaram temáticas como racismo, homofobia, etc.”


01 - Flávia Péret. Foto: Bianca de Sá


A leitura do livro de Peret (A Imprensa Gay no Brasil) despertou uma vontade no grupo de pesquisar um pouco mais sobre o jornal Lampião da Esquina, e com isso descobrimos muitas coisas interessantes.


02 - Livro: A imprensa gay no brasil - Flávia Péret


Concepção do Jornal Lampião da Esquina

Um dos pioneiros dentre a imprensa alternativa que discutiu a homossexualidade de forma política, múltipla e afirmativa, foi o célebre Jornal Lampião da Esquina. Este promoveu proposições de desconstruções de estigmas estacionados na sociedade sobre a homoafetividade como também construiu alianças junto aos movimentos considerados minoritários, colocando em destaque pautas sobre o feminismo, ambientalismo, assim como incluindo o movimento negro e questões indígenas em suas publicações.


03 - Exemplares do jornal Lampião da Esquina

O Lampião da Esquina surge em um período ditatorial no Brasil. Uma época marcada pela repressão e por perseguições, passando só então as temáticas do jornal concebíveis devido a abertura política que aconteceu na segunda metade da década de 70, em um momento que ocorreu a diminuição da censura no país.

Sendo assim, a ideia do jornal nasce de um encontro do ativista gay e editor-chefe da Gay Sunshine, Winston Leyland, com intelectuais brasileiros. Nesse momento, João Silvério Trevisan, Jean-Claude Bernardet, Aguinaldo Silva e Peter Fry em reunião na casa do artista plástico Darcy Penteado decidem organizar no Brasil uma publicação de cunho político definido, colocando à tona a questão dos direitos gays. Reunidos em colaboração com Adão Costa, Antônio Chrysóstomo, Clóvis Marques, Francisco Bittencourt, Gasparino Damata e João Antônio Mascarenhas, publicam em abril de 1978, na cidade do Rio de Janeiro, a edição número 0 do Lampião da Esquina.


04 - Lampião da Esquina nº 0

As pautas parceiras do Lampião da Esquina: 

Conforme nossa pesquisa foi se desdobrando, ficava claro que o Lampião abarcava em suas matérias muito mais que apenas as reivindicações dos públicos homossexuais. Em diversas manchetes o jornal denunciava e chamava a atenção para pautas tão urgentes quanto a sua inicial. Em capas como: “Brasil, campeão mundial de Travestis”, “Lesbianismo, machismo, aborto, discriminação” e “Negros, qual o lugar deles?”  Lampião demarcava com veemência seu posicionamento sociopolítico e deixava claro quais eram pautas que eram parceiras.

Na maioria das vezes o jornal trazia discussões com grande densidade e pessoas de referência para falar de alguma pauta específica, como Abdias do Nascimento para discutir sobre o movimento negro. O jornal também não se eximia das articulações políticas e trouxe o Presidente Lula para uma matéria exclusiva onde se discutia sobre as articulações populares, greve e feminismo. Apesar de explorar muitos temas com um tom satírico, o jornal não se limitava a isso e em cada linha escrita era possível obter informações pertinentes, sempre com uma linguagem crítica e bem embasada.


05 - Lampião da Esquina nº 14


Capas que Instigam:

Como dizem, “A primeira impressão é a que fica”, isso para um jornal é imprescindível, é o  que chama a atenção e faz os leitores diferenciarem seu periódico escolhido dos demais. A produção e design do jornal do Lampião, bebiam de diversas referências estéticas, em contraponto de uma ausência de recursos. 

Algo a se falar sobre a capa é o símbolo do jornal. O chapéu de cangaceiro representa o Lampião (nome do jornal e figura histórica do sertão brasileiro), possui círculos brancos e pretos decorativos e um triângulo no centro. O mais peculiar são os dois círculos e o retângulo (ou cilindro) embaixo do chapéu que servem para representar um rosto mas também representa o formato de um pênis. 


06 - Destaque da logo do Jornal Lampião da Esquina

Apresentar alguma notícia impactante ou alguma imagem atrativa é parte fundamental para a capa de qualquer tipo de projeto midiático que a apresenta, isso não seria diferente com o “Lampião da Esquina’’. Começando com a utilização de uma segunda cor, além do preto, o que o destaca dos demais jornais que são bastante preto no branco, eles utilizavam o verde ou o amarelo para dar um tom mais vibrante a capa, isso também mostra a característica de sempre utilizar bastante cores da comunidade, onde a bandeira que utilizam para representar o movimento possui a formação do arco-íris. As edições deveriam então suprir a necessidade de chamar atenção, fazer uma crítica, ter uma identidade visual e ainda sim, serem produzidas num esquema de cooperativismo e em curto período.


07 - Lampião da Esquina nº 13

As capas possuíam o estilo próximo das pornochanchadas e das charges (aqui no Brasil) e estilo diretamente vinculado à cultura visual Queer, pós moderna que ocorria e pautava a arte nos anos 70 (Nos Estados Unidos e Europa). 

A última coisa a se falar sobre a capa do Lampião são as chamadas principais escritas. Nem sempre o que estava estampado na capa do jornal estava presente dentro do mesmo, essa composição “caótica” se repetiu até o fim da produção do jornal, curioso pensar nisso porque normalmente a capa é onde se encontra as notícias mais importantes presente naquela edição, o Lampião fazia essa inversão para apresentar outros fatos e, às vezes, não sendo, necessariamente, a matéria mais importante que estava sendo noticiada. Ou seja, a seleção das notícias que se tornaram chamadas não foram hierarquizadas. No Lampião todas as possibilidades de chamar atenção, eram utilizadas, mas não necessariamente direcionadas à matéria mais relevante.

08 - Lampião da Esquina nº 15


Referências Bibliográficas:


CAE RODRIGUES, Jorge. Impressões de identidade: um olhar sobre a imprensa gay no Brasil. 1. ed. Rio de Janeiro: eduff, 2010


PÉRET, Flávia. Imprensa gay no Brasil: entre a militância e o consumo. Publifolha, 2011.

SANTOS, Wendel Souza.  O movimento LGBT no Brasil (1978- 1981): um estudo sobre o Jornal Lampião da Esquina. 2015.



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