segunda-feira, 19 de junho de 2023

Oralidade como fonte Histórica na Idade Contemporânea: A Resistência dos Quilombos


Universidade Federal de Minas Gerais
Escola da Ciência e da Informação
Disciplina: Metodologia de Pesquisa Histórica em Museus
Professor: Luiz Henrique Garcia
Aluno(a): Ana Carolina Gomes Fiuza, Bia Pimentel, Jéssica de Almeida Silva, Laura Braga Melo, Thais de Souza Costa.


Dentro das disciplinas das humanidades, como História, Antropologia e Ciências Sociais, a história oral enfrenta o desafio de obter legitimidade e respaldo científico. A institucionalização da história oral é necessária para que seja reconhecida como um método válido de pesquisa, mas até que ponto essa institucionalização pode deslegitimar os povos que historicamente têm sido marginalizados e excluídos da narrativa histórica convencional?

A pesquisa histórica requer rigor técnico e metodológico para garantir a qualidade e a confiabilidade dos dados coletados. No entanto, a história oral busca valorizar as vozes e as experiências dos grupos sociais que foram historicamente silenciados e negligenciados pela história oficial, além de permitir resgatar trajetórias e memórias que foram suprimidas ou ignoradas pela narrativa dominante.

O recorte que trazemos nos elucida bastante sobre isso, os Quilombos foram comunidades formadas por descendentes de escravizados africanos que resistiram ao sistema de escravidão no Brasil entre os séculos XVI e XIX, com cerca de cinco milhões de escravizados desembarcados do continente africano, os Quilombos surgiram como uma forma de resistência e preservação da cultura e identidade negra. O termo "Quilombos" era utilizado em alguns locais do continente africano para designar acampamentos fortificados e militarizados mas, no Brasil, eles se configuraram como grupos étnico-raciais, autoatribuídos, que resistiram ao processo de escravidão. Somente a Constituição Federal de 1988 garantiu os direitos sobre a propriedade das terras dos Quilombos, consagrando suas diversas existências e importância na sociedade brasileira.

As comunidades quilombolas são reconhecidas e protegidas pela legislação brasileira, especialmente pelo Decreto nº 4887/03, que estabelece critérios para o reconhecimento e titulação das terras ocupadas por essas comunidades. Esse reconhecimento garante o direito à propriedade e à preservação da identidade cultural quilombola. Essas comunidades têm uma

história de resistência à escravidão e à opressão histórica sofrida pelos povos africanos e afrodescendentes no Brasil.

Então, pensando a partir da identidade quilombola, ela vai além de características étnicas, sendo construída a partir da vivência e da experiência dos indivíduos, onde a autodefinição como quilombola pode ser influenciada por intervenções de órgãos governamentais e não governamentais (SOUZA, 2007). A persistência cultural dessas comunidades é mantida principalmente pela tradição oral, transmitida de geração em geração, onde a oralidade primária desempenha um papel fundamental na gestão da memória social, preservando a história, os conhecimentos e as tradições quilombolas e trazendo novamente o nosso campo de pesquisa. A história oral permitiu que essas comunidades ganhassem visibilidade e reconhecimento em âmbito nacional e internacional, resultando em algumas conquistas de direitos e seu registro na história do Brasil.

É importante refletir sobre a prática da história oral e garantir que as vozes das comunidades quilombolas sejam representadas de forma autêntica e respeitosa. A história oral deve ser uma ferramenta de empoderamento e autodeterminação, permitindo que as próprias comunidades tenham controle sobre suas narrativas e contribuam para a compreensão coletiva do passado.

Nas comunidades quilombolas em Minas Gerais, há uma riqueza de histórias compartilhadas por meio de versos, conversas e tradições transmitidas de geração em geração. Aprender habilidades artesanais, como a trança de milho e a confecção de cestas, é uma prática comum nessas comunidades, assim como a utilização de tecnologias sociais para o aproveitamento de água da chuva e técnicas de plantio no semiárido.




Foto: Peça de Algodão no Tear - Artesã Natalina Soares de Souza - Associação de Produtores e Artesãos
de Rosa Grande - Berilo – Crédito foto: Lori Figueiró do Livro "À luz do algodão".


A religiosidade também desempenha um papel importante nessas comunidades, com cada uma celebrando seu santo padroeiro em momentos diferentes ao longo do ano. As festas tradicionais são marcadas por quitandas doces e salgadas servidas com café, acompanhadas de ritmos musicais característicos. Essas comunidades quilombolas em Minas Gerais representam uma parte significativa do patrimônio cultural e histórico do estado, sendo essencial valorizar e preservar suas tradições e conhecimentos.


Foto: As congadas - Congadeiro Domingos da Paixão (in memoriam). Crédito da foto: Hélio Dias (2015)


Para mais, é importante refletir sobre como a história oral é praticada e como as vozes das comunidades são representadas, é necessário evitar a apropriação indevida das histórias e das narrativas das comunidades, garantindo que elas sejam protagonistas na construção e na interpretação de sua própria história, onde a história oral deve ser uma ferramenta de empoderamento e autodeterminação, permitindo que as comunidades tenham controle sobre suas narrativas e contribuam para a compreensão coletiva do passado.

A Nova História, descrita por Bloch (2001), proporciona uma visão mais inclusiva e diversa da história, reconhecendo a importância das culturas populares e das comunidades marginalizadas na formação da sociedade e, com a valorização da oralidade, entendida como forma de construção da história, têm-se ampliado as perspectivas históricas, desafiando as narrativas dominantes e promovendo uma maior compreensão da pluralidade de experiências e identidades que compõem o tecido social.

Por fim, a história oral desafia os padrões tradicionais de documentação histórica, pois requer uma legitimação e respaldo científico para ser reconhecida. A institucionalização da história oral pode ser vista como uma forma de deslegitimar as comunidades que são marginalizadas pela narrativa histórica dominante. No entanto, a "nova história" busca dar voz aos grupos sociais historicamente excluídos, valorizando suas experiências e conhecimentos transmitidos pela oralidade.

Referências

BLOCH, Marc. Introdução e cap 1. In: Apologia da História. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

SOUZA, Ercilia M. S.. Processos Identitários e suas Vicissitudes em uma Comunidade Quilombola. Belém, 2007 Dissertação (Psicologia) - UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ.
 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário