quarta-feira, 16 de maio de 2018

100 anos de Athos Bulcão


Estive agora há pouco no CCBB conferindo a exposição "100 anos de Athos Bulcão" [informações gerais]. Fique agradavelmente surpreendido com o que vi. Se não há nada propriamente impressionante, em termos de pesquisa ou expografia, também não cai nas espetacularizações baratas ou lapsos graves que às vezes encontramos por aí. É, a meu ver, um trabalho correto, que não complica, não enche linguiça - fazia tempo que eu não sentia tanto a amplidão das salas do CCBB, invariavelmente preenchida por mobiliário expográfico em excesso para disfarçar a escassez de obras, o que desta vez não seria preciso - e consegue apresentar ao público um bom panorama retrospectivo da obra do artista, cumprindo o que se propõe numa exposição para celebrar esse tipo de efeméride. Sai-se particularmente bem em mostrar a diversidade de materiais e linguagens com que Athos Bulcão trabalhou, claro que inevitavelmente destacando a integração entre arte e arquitetura, com as obras para prédios públicos e o vínculo com o projeto modernista brasileiro. Claro que há um destaque para a azulejaria, mas talvez a promoção da mostra não esteja a contento, e ao centrar fogo nela, não consegue dar a ver antecipadamente ao público a multiplicidade de objetos e expressões que dispõe ao longo das salas. Além de obras acabadas que incluem pinturas, desenhos, fotomontagens, esculturas com finalidade acústica e até vestuário, maquetes, estudos, plantas e projetos deixam ver o processo de forma mais completa e esclarecedora. Combinado com depoimentos muito bem pinçados do artista - o que revela uma pesquisa competente - e com a alternância entre cinza e cores fortes nas paredes que conversam com o acervo exposto, esse material todo oferece ao público um bom ponto de partida para entender como Bulcão pensava e dava forma à sua criação, inclusive contando com a colaboração inadvertida dos operários da construção civil na colocação dos azulejos. Mas isso poderia, inclusive, se houvesse ousadia para tal, suscitar perguntas sobre autoria, colaboração e reconhecimento onde as fronteiras entre arte e trabalho, invenção e reprodução, entre outras, se borram. Nesse ponto esta e tantas outras exposições de arte silenciam, apesar de terem sido os próprios artistas os primeiros a brincarem com esse fogo.





Além disso, se é legítimo trazer obras de outros artistas para mostrar diálogos e repercussões em produções posteriores, faltou algo mais que mencionar os nomes destes em legendas. Agora, escorregada mesmo foi o aparato de interação, bobo, previsível, sem maiores opções para impulsionar a criatividade do público ou dar algum entendimento prático do trabalho do artista. Dispensável. Finalmente, se a exposição nos situa bem quanto a forte presença da criação de Bulcão no espaço público de Brasília, para outras cidades em que ela se apresenta nem tanto. Caberá provavelmente ao programa educativo compensar a falta de ênfase ao laço dele com BH, como mostrou muito bem a reportagem de Gustavo Werneck no Estado de Minas.  No geral vale a pena dar uma conferida, para ver, além das obras, claro, uma exposição bem realizada acima da média, sem se complicar.
Ah, tem também uma de curta duração "Dragão Floresta Abundante", fruto da residência do artista Christus Nóbrega na China. Muita coisa é clichê mas não deixa de ser oportunidade rara de ver material vindo de lá.