segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Em dia com a museologia: podemos descolonizar os museus?

Essa pergunta, em outras palavras, já vem sendo feita desde a década de 1970. Desde a Mesa de Santiago. Entretanto, se perguntar é relativamente fácil, responder parece ser uma tarefa bem mais árdua. À qual não me furto. Por isso mesmo proponho disciplinas optativas como Museu, espaço e poder e Museu e cidade. Em alguns momentos parece que as respostas vêm de uma troca de sinal, de uma proposta muito repetitiva calcada na construção de identidade.  A fala de Javier Royer Rezzano, coordenador do Sistema Nacional de Museus do Uruguai, me parece que vai um pouco além:

“A colonização não vem apenas de fora, é feita também a partir de dentro, é como a divisão Norte/Sul, que não é só global, existe na nossa própria casa”, observa. “O museu tem de falar de todos e com todos – ricos e pobres, dominantes e dominados, elites e excluídos –, porque, quer queira quer não, é um espaço político.”

A matéria do Público [completa, aqui] lança uma visada crítica a partir de questionamentos como  "(...) esta mudança não se faz sem a consciência de que o museu é também um território de conflito, em que se vão cruzar visões díspares em resposta a perguntas fundamentais: O que é uma obra de arte? A que nos  referimos quando falamos de história nacional? Como se mostra o extermínio dos povos indígenas?

A resposta portando não deverá ser a de um museu ecumênico, neutro, no fundo impossível, mas de um museu que se posiciona e explicita seu posicionamento. Que diz de onde fala. Que não esconde os conflitos, e sim os assume como constitutivos da experiência social e da construção dos conhecimentos. Não um museu espelho, que sacia a demanda narcisista, mas um museu que promove a reflexão, que desloca o público, que interfere no cotidiano.

Julgo oportuna a inclusão inclusão do link para o texto completo da tese "Máscaras guardadas: musealização e descolonização" de Bruno Brulon Soares, de quem já conheço alguns trabalhos voltados para o contexto recente da museologia. Um estudo de caso, voltado para o cenário francês, mas que permite embasar reflexões interessantes. Transcrevo o resumo, abaixo:

 RESUMO:
 A tese tem o objetivo de investigar os processos de musealização na França, entre os museus dos Outros e os museus de Si, como classificados por especialistas da antropologia, refletindo sobre as especificidades e a historicidade dessas categorias a partir do estudo de museus etnográficos tradicionais e ecomuseus. A  pesquisa tem como objeto social de análise os enunciados das instituições e a construção de performances culturais nas diferentes matrizes de museus colocadas em  perspectiva pela teoria antropológica. Através de uma análise etnográfica e histórica  procura-se entender os processos de musealização atualmente no  Musée du quai Branly, considerando a vida museal dos objetos transformados em ‘obras de arte’ e os seus sentidos para os atores desse museu. Na análise do desenvolvimento dos ecomuseus na França, buscou-se, com o estudo do Ecomuseu da comunidade urbana do Creusot Montceau-les-Mines, esboçar uma reflexão sobre a musealização dos contextos através da valorização do ‘patrimônio íntimo’, ressignificado pelo grupo social local. À luz dos casos selecionados, interessa analisar os movimentos identitários da representação do Outro e a de si nos museus. É este permanente construir-se e ver-se através do Outro, que caracteriza a relação etnográfica que queremos entender para elucidar os processos  pelos quais os museus escolhem o que“guardar para transmitir”.
 

Palavras-chave:
Museu. Museu etnográfico. Ecomuseu. Processos de musealização