domingo, 22 de fevereiro de 2015

Museu e colonização [Tipologia 2014]



alun@s/autores: GUILHERME DRUMMOND; LUÍSA FRANCO GUIMARÃES; THAIS LOPES DIAZ; VANESSA TORRES
CURSO: Museologia ECI/UFMG
PROFESSOR: LUIz HENRIQUE ASSIS GARCIA
DISCIPLINA: TIPOLOGIA DE MUSEUS
MUSEOLOGIA 2014/2
 Museu e colonização

Sabe-se hoje que os museus são palcos primeiros da representação do homem e da sua cultura. São espaços onde o homem constrói, afirma e reafirma a sua identidade. Um museu pode muito bem ser representante de sua comunidade, contando e realizando, no presente, sua história. Dessa forma, podemos entender a importância e a responsabilidade dos museus nacionais, uma vez que é seu papel abarcar a identidade de todo um país. Porém nem sempre essa relação se dá de maneira simples.
A história mundial não existe sozinha. Ela é um emaranhado das trajetórias de todas as nações que a compõem, e no campo da cultura não é diferente. O colonialismo impôs uma hierarquia mundial com as diferentes nações ocupando papéis muito claros. Os colonizados praticamente não tinham vez ao observar os colonizadores varrerem tudo que era considerado relevante e interessante para exporem em suas suntuosas salas de exposição, como um troféu representando a dominação de um país sobre o outro.



 Charge demonstrando a relação colonizador-colonizado


Com o passar do tempo, essa mentalidade controladora foi ganhando cada vez mais opositores. Nessa esteira de pensamento que ocorre a Convenção relativa às medidas a serem adotadas para proibir e impedir a Importação, Exportação e Transferência de Propriedades Ilícitas dos Bens Culturais, realizada em 1970 em Paris. Em um período pós-colonialista onde se pregava a importância individual das culturas não fazia sentido a exploração e expropriação dos países-colônia. Estes lutavam pela independência e emancipação, e isso somado aos próprios movimentos civis dos países colonizadores passaram a chamar atenção para essa questão.

Apesar de o problema dessa expropriação hoje estar identificado isso não significa que os limites estejam claramente estabelecidos e podemos encontrar grandes instituições que são palco polêmico desse assunto. Um dos mais conhecidos é o do museé du quai Branly.
Localizado na França em Paris, é um museu que abriga coleções de obras de arte primordiais. O espaço é dividido em grandes zonas continentais (África, Ásia, Oceania e Américas). O museu promove dez exposições temporárias por ano além da exposição permanente. Temas políticos sempre rodearam o du quai Branly, desde a sua proposta inicial, foi tema de muitas criticas boas e algumas não muito favoráveis desde sua criação. O museu enfrentou uma acusação em 1999, quando estava ainda em fase de construção, de que três estátuas de terracota nok da Nigéria, adquiridas a preços milionários, foram compradas de maneira ilegal. Por fim o assunto foi resolvido com um acordo comum entre os países. Por conta de gastos exorbitantes com aquisições, o museu também foi alvo de manifestações que questionavam os gastos de 150 milhões de francos com o acervo por exemplo.
Considerando, identidade, como um conjunto de caracteres próprios e exclusivos, é possível questionar se os objetos expostos em espaços grandiosos como o museé du quai Branly perdem esses conjuntos de caracteres próprios e exclusivos ao saírem de seu local de origem e se instalarem em mega exposições como as promovidas pelo du quai Braly, por exemplo. FIGUEIREDO (2012), graduada em arquitetura e urbanismo pela FAU-USP, mestre em design e arquitetura pela mesma instituição, faz o seguinte apelo sobre como compreende o espaço museu:
Os museus são, em sua essência, instituições de pesquisa que divulgam os resultados destes estudos nos espaços expostivos e tem – ou deveriam ter – um compromisso com a disseminação do conhecimento. É, portanto através da exposição que o museu se comunica com o público e um elemento essencial para estabelecer esta comunicação é a expografia. (Renata Dias de Gouvêa de Figueredo - p.02)
O fato de um espaço museal utilizar como tema “arte primitiva” faz com que seja um atrativo a mais para os turistas que vão ao museu, contudo é de extrema importância a forma como esse visitante irá compreender o que está sendo exposto. Uma estatueta, como as de terracota nok adquiridas pelo museu, por exemplo, carrega um significado de uma civilização milenar, porém basta saber se os números de visitantes atingidos em um dia no museé du quai Branly deixam o espaço com essa critica formada. É incerto conseguir captar essas informações de um visitante ao sair do museu, e é por esse motivo que não se sabe de imediato se os objetos de “arte primitiva” expostos cumprem essa função de disseminar uma tradição ou se são vistos como meros objetos de uma mega exposição como outras que acontecem no mudo anualmente.



Interior do Museé du quai Branly


Podemos observar então que essa discussão do pertencimento do patrimônio ainda é muito pertinente e muitas questões podem ser levantadas em torno dela. Muito se argumenta que alguns bens serão melhor preservados fora de seu país de origem onde receberão “seu devido valor”, porém quem é que deu esse valor em primeiro lugar? Os próprios criadores e usuários do bem ou uma figura externa? O que esses bens representam ou podem a vir representar para a cultura de seus países? Existe também uma comodidade turística muito grande ao se poder visitar várias culturas em um só destino, mas isso é o suficiente para justificar essa apropriação cultural?
Como já dito, essa discussão não é um assunto esgotado, muito pelo contrário, levantando questionamentos que devem ser sempre levados em consideração. Dessa forma, o museu deve sempre estar atento a essas armadilhas do discurso museológico, para que possam utilizar todo o seu potencial de guardião e propagador de uma cultura, informação e memória mais democráticos e compromissados com a realidade.

BIBLIOGRAFIA:
·        FIGUEIREDO, Renata Dias de Gouvêa de. Reflexões acerca de uma crítica expográfica. Blog Crítica Expográfica, 5 mar. 2013. Disponível em http://criticaexpografica.wordpress.com/2013/03/05/reflexoes-acerca-de-uma-critica-expografica-artigo/>. Acesso em: 18 nov. 2014.

·         GOLSTEIN, Ilana. Reflexões sobre a arte “primitiva”: o caso do Museé Branly. Horiz. Antropol. [online]. 2008, vol. 14, n. 29 [cited 2013-08-27], pp. 279-314.

·   UNESCO, Convenção relativa às medidas a serem adotadas para proibir e impedir a Importação, Exportação e Transferência de Propriedades Ilícitas dos Bens Culturais, 1970.
 

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