terça-feira, 25 de novembro de 2025

Entre Memórias e Córregos: uma intervenção museológica no Museu Histórico Abílio Barreto

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
GRADUAÇÃO EM MUSEOLOGIA
MUSEOLOGIA II
LUIZ HENRIQUE ASSIS GARCIA
FUNÇÃO SOCIAL DOS MUSEUS
DENISE GUIMARÃES FERREIRA
CARLOS HENRIQUE NUNES
RAFAEL DE OLIVEIRA
MADISON ALEX MARTINS SILVA
BELO HORIZONTE, MG
NOVEMBRO DE 2025

Entre Memórias e Córregos: uma intervenção museológica no Museu Histórico Abílio
Barreto

 
O Museu Histórico Abílio Barreto (MHAB) abriu suas portas e sobretudo sua escuta para
receber uma ação museológica desenvolvida pelos estudantes do terceiro período do curso de
Museologia, numa parceria que reforça o vínculo entre formação profissional, instituições de
memória e a comunidade que as circunda. Sob coordenação de Ana Portugal, o museu
acolheu com entusiasmo a proposta acadêmica orientada pelo professor Luiz Henrique Assis
Garcia, consolidando um espaço de intercâmbio entre saberes, práticas e experiências.
A intervenção, realizada no mês de novembro e integrada à exposição de longa duração
“Belo Horizonte fora dos planos”, buscou reacender discussões sobre o Córrego do Leitão,
um dos importantes cursos d’água que marcaram não apenas a geografia, mas também o
cotidiano e a história afetiva de Belo Horizonte. Hoje quase invisível sob o asfalto da
Avenida Prudente de Morais, o córrego tornou-se ponto de partida para um diálogo mais
amplo sobre urbanização, memória e diálogo da população.



O processo de pesquisa e a construção da intervenção

Para desenvolver o trabalho, o grupo de estudantes realizou uma pesquisa que confrontou
imagens históricas e registros fotográficos contemporâneos, criando uma linha do tempo
visual capaz de evidenciar as transformações do território. Este procedimento, comum à
metodologia museológica, trouxe à tona questões sobre o planejamento urbano de Belo
Horizonte e suas consequências sociais, ambientais e culturais. Afinal, que cidade foi
projetada? Que cidade emergiu? E que cidade ainda desejamos construir?
Além disso, foram realizadas entrevistas com moradores que vivenciaram o período da
canalização do Córrego do Leitão. Muitos relataram a presença da água correndo a céu
aberto, as brincadeiras infantis, as dinâmicas dos bairros vizinhos e, sobretudo, o impacto das
obras que alteraram a paisagem de forma definitiva. Esses depoimentos constituíram um
patrimônio imaterial valioso, capaz de conectar diferentes gerações ao mesmo espaço urbano.
Todo esse conteúdo foi reunido em uma página digital acessível através de um QR Code
instalado no saguão do museu. Durante os meses de novembro e dezembro, visitantes podem
escanear o código e navegar pelos materiais da pesquisa, fotografias comparativas, relatos e
reflexões, ampliando sua compreensão sobre a cidade e sobre os elementos que se ocultam
sob sua superfície.


 

Link para o site: https://corregodoleitao.my.canva.site/inicio/

A Roda de Conversa: ativando o museu como espaço vivo
O ponto alto da intervenção ocorreu no dia 8 de novembro, quando foi realizada uma Roda de
Conversa aberta ao público. Estudantes, moradores, visitantes e equipe do museu se reuniram
no saguão para trocar percepções, lembranças e inquietações sobre as mudanças urbanas que
moldaram o bairro e o próprio córrego.
A dinâmica da conversa mostrou como o museu pode funcionar como um espaço de encontro
e escuta, no qual diferentes vozes se articulam para pensar a cidade. As falas revelaram não
apenas informações, mas afetos: histórias familiares, lembranças da infância, críticas ao
processo de urbanização e reflexões sobre como a população pode participar das discussões
que impactam seu cotidiano.


Para muitos participantes, a sensação era de reencontro com um passado que ainda vive,
mesmo que soterrado pelas camadas de concreto. Para outros, especialmente os mais jovens,
tratou-se de um primeiro contato com uma dimensão histórica da cidade que raramente
aparece nos discursos oficiais.

Impactos e reflexões sobre a função social do museu
A experiência demonstrou como ações museológicas simples, porém bem estruturadas,
podem ativar a função social dos museus: promover o diálogo, estimular a consciência crítica
e valorizar memórias que pertencem à coletividade. O Museu Abílio Barreto, ao acolher esse
projeto, reafirmou seu papel como instituição que não apenas preserva a história de Belo
Horizonte, mas também cria pontes entre passado e presente.
O museu, neste caso, funcionou como catalisador de debates e como território de
convivência. Em uma cidade marcada por intensas transformações urbanas, pensar o espaço
público, os cursos d’água, a memória e a participação cidadã é fundamental para construir
formas de pertencimento e responsabilidade coletiva.


A intervenção, assim, extrapolou o âmbito acadêmico. Tornou-se um exercício de escuta e
diálogo, trazendo à tona a importância de se compreender que a história da cidade não está
restrita aos livros ou às vitrines das exposições lá está também escondida nos córregos
canalizados, nas lembranças de quem os viu correr e nas possibilidades de futuro que ainda
podemos imaginar.

CENTRO DE MEMÓRIA E DOCUMENTAÇÃO MANOEL HYGINO DOS SANTOS [Santa Casa]

UFMG - ECI - Curso de Museologia

MUSEOLOGIA II 

Prof.: Luiz H. Garcia

Grupo: Beatriz Fonseca, Clara, Julia, Karen, Viviane e Zaya.


CENTRO DE MEMÓRIA E DOCUMENTAÇÃO MANOEL HYGINO DOS SANTOS

Centro de Memória Santa Casa da Misericórdia


O Centro de Memória e Documentação Manoel Hygino dos Santos é o espaço responsável por salvaguardar a história da Santa Casa de Belo Horizonte , além de promover ações culturais, educativas e de preservação.

Reconhecido pelo Ibram

Espaço com temática Ciências Exatas, da Terra, Biológicas e da Saúde

Possui plano museológico

Participa de eventos museológicos que ocorrem em Belo Horizonte


___________________________________________________________________________

ROTEIRO


Você conhece… O Centro de Memória da Santa Casa?


Também conhecido como Centro de Memória e Documentação Manoel Hygino dos Santos, o Centro de Memória da Santa Casa é um espaço que propaga os anos de história do Hospital Santa Casa, localizado na área hospitalar de Belo Horizonte, onde também está situado o Centro de Memória da instituição.


A Santa Casa da Misericórdia é a instituição médica mais antiga de BH, sendo inaugurada juntamente com a cidade, em 1897.


São 127 anos de uma história que merece ser conhecida e reconhecida pela população belorizontina e que é honrosamente reavivada pelo Centro de Memória e Documentação Manoel Hygino dos Santos.


O Centro de Memória é localizado na Antiga Maternidade Hilda Brandão, prédio inaugurado em 1916 e a primeira maternidade de Belo Horizonte. A antiga maternidade é tombada pelo IEPHA-MG (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais), que reconhece sua importância devido a sua arquitetura e seu valor histórico-médico. Além do Centro de Memória, na Antiga Maternidade também funcionam a provedoria, a diretoria e os setores administrativos da Santa Casa BH.

 

Exemplar do folder proposto: 




Exposição – Teatro FELUMA / Centro de Memória da Faculdade Ciências Médicas

 Exposição – Teatro FELUMA



 

Como graduandas do curso de Museologia pela Universidade Federal de Minas gerais (UFMG), nos foi proposto na disciplina Museologia II, escolher uma instituição para a fazermos um projeto de intervenção, como uma das integrantes do grupo faz estágio na Faculdade Ciências Médicas a escolhemos para este trabalho. O grupo é composto pelas seguintes alunas do 3º período da graduação:

Helena Costa Vilela CecilioJaqueline dos Santos AlvesSofia Fernandes de Abreu PenidoRebeca Dias Alves.

A escolha da Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais como foco para nossa proposta inicial, nos deu liberdade para iniciar a delinear o que gostaríamos de fazer. Inicialmente visamos fazer um estudo de público, analisar o perfil dos visitantes buscando melhorias no Centro de memória, tanto na exposição como nas mediações que são ministradas. Entretanto, esse tipo de pesquisa/avaliação já é realizada pelas instituições Feluma, assim, optamos por um caminho diferente.

Após analisar a CPA e os comentários feitos ao Centro de Memória, um se destacou, já que o denominava como “um lugar morto”, o que na visão dos que vivem cercados de história não fazia sentido, a memória representa a vida, o acervo carrega a vida de muitas pessoas que auxiliaram na estruturação da faculdade e da própria medicina mineira. Portanto, com o desejo de levar toda essa vida que enxergamos no interior da exposição e da Reserva Técnica, decidimos que a nossa intervenção social e missão, seria externalizar e resignificar esse acervo para os alunos, colaboradores e visitantes da Fcmmg.



Todos os cursos representados através do acervo do Centro de Memória:

 

Medicina

Fisioterapia

Enfermagem

Psicologia

Odontologia

Fonoaudiologia

- Laboratório Portátil de Urina

(Exposição)

- Aparelho Coluna Cervical

(Armário entrada)

- Pote de Algodão

(Exposição)

- Livro de Diagnósticos

(?)

- Conjunto 5º Cúpula

(CM Odonto)

- Audiômetro 

(Exposição)

- Caixa com equipamentos de Otorrino

- Bolsas Quentes

(Armário Entrada)

- Seringas e Agulhas 

(Reserva Técnica)


- Casinha de Boneca 

(Reserva Técnica)

- Livros 

(CM Odonto)

- Orelha ou Laringe; (Modelo Anatômico)

- Estojo de Ampolas

(Caixa A4h)

- Ultrassom

(Armário Entrada)

- Talas de madeira 

(Reserva Técnica)

- Família Terapêutica

(Exposição) 

- Tampo e pia 

(Reserva Técnica)


  

TOTAL: 17 Itens do Acervo e 2 Itens anatômicos sintéticos (empréstimo pendente).
 

Com o auxílio do nosso Professor Luiz Henrique Assis Garcia e da Museóloga Paola Andrezza Bessa Cunha, conseguimos entrar em contato com os participantes/supervisores do Instituto Cultural Ciências Médicas e apresentar nossa proposta. A exposição de curta duração: De Volta Para o Futuro Ciências Médicas, teria como objetivo principal mostrar a evolução nos modos de se praticar e aprender dos cursos oferecidos pela faculdade. O acervo selecionado seria separado em 6 cúpulas, emprestadas do Centro de Memória do Campus II da Fcmmg, utilizando cada uma delas para representar os respectivos cursos de Medicina, Fisioterapia, Enfermagem, Psicologia, Odontologia e Fonoaudiologia.

Os expositores seriam transferidos até o Foyer do Teatro Feluma e organizados na parede lateral, em frente às paredes de vidro. As legendas seriam feitas através de um sistema de enumeração, em que se posiciona o número à frente do objeto e na cúpula a legenda completa sobre seu nome, época, curso e utilidade, para que assim não houvesse uma poluição visual. À frente de tudo, no início da exposição haveria um Banner para contextualizar os visitantes sobre tudo.

No período que a exposição estivesse disponível deixaríamos uma urna para que os visitantes pudessem expressar sua opinião, além de sugerir para que visitassem ao Centro de Memória (localizado no primeiro andar da instituição). Com o auxílio da planilha de visitantes, já utilizada no CM, e a urna, faríamos a análise para ver se o projeto atingiu seu objetivo de trazer mais pessoas para dentro do Centro de Memória e formar esse vínculo com o passado, entendendo a participação deles nessa história. Toda essa pesquisa seria disponibilizada à Fcmmg.

Gostaríamos de transmitir que um dia tudo que a Faculdade possui no acervo, já foi o cotidiano de muitos alunos e profissionais, e fazer com que percebam como hoje constroem a história que será admirada pelos futuros alunos, colaboradores, visitantes e familiares. A memória se torna viva quando se tem a oportunidade de participar dela e é perpetuada por aqueles que a admiram.


Casa do Baile: preenchendo o espaço em branco

 
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS GRADUAÇÃO EM MUSEOLOGIA
DISC.: MUSEOLOGIA II 

PROF. LUIZ HENRIQUE ASSIS GARCIA

CURSANTES: ANA SOPHIA NUNES SILVA, FERNANDA VEIGA DIAS, KETTY MARA GOMES, LAISA DANIELLA XAVIER DA CUNHA, MARIANA HELLEN DE JESUS, RENATA CABRAL MORAES

BELO HORIZONTE, 2025

Casa do Baile: preenchendo o espaço em branco


INTRODUÇÃO


A Casa do Baile, projetada por Oscar Niemeyer e inaugurada em 1942, integra o conjunto arquitetônico da Pampulha e chama atenção pela leveza das curvas e pela relação com a lagoa. Ao longo do tempo, o espaço ganhou diferentes usos e hoje continua despertando curiosidade em quem passa pela orla, seja para visitar a exposição, descansar ou apenas observar a paisagem. Estudos sobre a Casa do Baile destacam justamente essa variedade de percepções, mostrando como a arquitetura moderna se combina com experiências afetivas e espontâneas dos visitantes, que se apropriam de diferentes formas do edifício. Essa ideia serviu como ponto de partida para pensarmos nossa proposta de intervenção.




PROPOSTA DE INTERVENÇÃO NA CASA DO BAILE

A intervenção “Casa do Baile: Preencha o Espaço em Branco” nasceu do desejo de criar um momento de escuta dentro da própria visita. Queríamos oferecer ao público a chance de se expressar livremente, registrando sensações, críticas, lembranças ou interpretações pessoais sobre o espaço, ou seja, algo que fosse simples, mas que colocasse o visitante no centro da experiência. Nosso objetivo principal era compreender como diferentes pessoas constroem significado para o lugar e de que forma a Casa do Baile é vivida.

Para isso, no dia 7 de novembro de 2025, realizamos a ação na entrada da Casa, próximo à saída da mostra. À medida que as pessoas finalizavam a visita, nós as abordávamos e entregávamos um pequeno bloco de notas e uma caneta. O convite era direto e aberto: escrever ou desenhar qualquer impressão que a passagem pela Casa do Baile tivesse despertado. Não havia perguntas orientadoras nem expectativa de resposta específica, a proposta era justamente permitir que cada pessoa preenchesse o espaço em branco a partir de sua própria vivência.





ANÁLISE DAS RESPOSTAS

As mensagens recolhidas mostram como a Casa do Baile é percebida de formas múltiplas e afetivas. Algumas respostas revelam encantamento pela paisagem e pela arquitetura, outras apontam questões de uso, horário de funcionamento ou sensação de pouca ocupação do espaço. Aparecem também lembranças pessoais, memórias familiares e comentários sobre a exposição visitada. Entre as respostas, destacam-se:

“Bela obra arquitetônica, mas o espaço é mal utilizado.”


“A Casa do Baile lembra minha família.”


“Gostei da história do lugar.”


“Entrei para usar o banheiro, mas o lugar é bonito.”


“A experiência que eu mais gostei foi de tocar nos livros.”


“Uma experiência fantástica. Eu e minha família sempre viemos ver essa obra de arte.”


 






CONSIDERAÇÕES FINAIS


A intervenção mostrou que gestos simples de escuta podem fortalecer a relação entre visitante e instituição. Ao convidar as pessoas a deixarem suas impressões, abrimos um espaço de diálogo que complementa a mediação tradicional e aproxima o público do patrimônio. Afinal, a Casa do Baile não é apenas um ícone arquitetônico, é um lugar que ganha sentido a partir das pessoas que passam por ele todos os dias.



REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
SOUZA, Carolina Pimentel; TAMEIRÃO, Daniela; FARIA JUNIOR, Evandro José; MACHADO, Giovanna Maria de Paula; MELO, Thays Lucas de. Que lugar é esse? Visitas espontâneas e seu público na Casa do Baile. In: Museus, Educação e Território: experiências educativas na Pampulha. Belo Horizonte: Fundação Municipal de Cultura; Instituto Lumiar, 2024. p. 121-125.

terça-feira, 21 de outubro de 2025

Versos que revelam histórias e vivências: 13 de Maio ao Jogo de Angola

Universidade Federal de Minas Gerais
Bacharelado em Museologia
Metodologia de Pesquisa Histórica em Museus
Docente: Luiz Henrique Assis Garcia

Discentes: Alessandro de Oliveira; Alice Martins; Clarissa Tomasi; Flávia Valença; Lorena Gonçalves e Suzane Rodrigues




Introdução


Este trabalho analisa a partir de uma perspectiva histórica, cultural e museológica o samba como instrumento de resistência e afirmação identitária, tomando como base as trajetórias de duas cantoras mineiras: Maria Aparecida Martins e Clara Nunes. Para isso, aborda as canções “13 de Maio” (1979) de Maria Aparecida e “Jogo de Angola” (1980) interpretada por Clara Nunes, buscando evidenciar os eventos e referenciais históricos, políticos e sociais presentes em seus versos. O recorte se justifica tanto pelo papel dessas artistas na construção simbólica do Samba Mineiro, quanto por suas atuações enquanto mulheres inseridas nesses contextos distintos de racialização, mercado musical e expressões culturais e religiosas. A metodologia segue um caminho comparativo entre as produções musicais, abordando as canções como documentos históricos e culturais que permitem refletir sobre a diáspora africana e suas manobras de sobrevivência, como a malandragem e o samba refletindo a realidade como forma de memória e resistência.


Maria Aparecida Martins (1939/1940-1985)
- Música 13 de Maio


Nasceu em Caxambu (MG); foi curimbeira, cantora, compositora, médium e mãe de santo, reconhecida por integrar elementos da religiosidade afro-brasileira ao samba, destacou-se por sua militância cultural e espiritual em um contexto de pouca visibilidade para mulheres negras compositoras. Mudou-se com a família para o Rio de Janeiro aos 10 anos, onde começou a trabalhar como passadeira, iniciando suas composições aos 13 anos. Participou do programa A Voz do Morro, de Salvador Batista, por uma década, e também se apresentou nas rodas de samba do Grupo Opinião, um importante espaço de resistência à ditadura militar, que promoveu uma arte de oposição ao regime (SÁ, 2020).

Foi mãe de 2 meninos, porém devido a circunstâncias difíceis, foi obrigada a entregar os filhos para adoção logo após o nascimento. Aparecida alcançou o sucesso em concursos de música carnavalesca e festivais, com composições como “Meu Rio Quatrocentão” e “Zumbi, Zumbi”. Em 1968, tornou-se a segunda mulher (antes dela apenas Dona Ivone Lara) a vencer uma disputa de samba-enredo, com a obra "A Sonata das Matas", para a escola Caprichosos de Pilares. Não se tem registros de mulheres mineiras, anteriores à Aparecida, com projeção nacional significativa no samba, o que torna sua história tão importante para a trajetória feminina no samba mineiro.

A música "13 de Maio", composta por Maria Aparecida Martins em 1979, é uma obra profundamente enraizada na história e na espiritualidade afro-brasileira. Ela entrelaça elementos históricos, culturais e religiosos para celebrar a luta, a resistência e a ancestralidade do povo negro no Brasil. A música tem como eixo central a data de 13 de maio de 1888, dia da assinatura da Lei Áurea, que aboliu formalmente a escravidão no Brasil. No entanto, ao invés de uma comemoração vazia, a canção a ressignifica como símbolo de memória, resistência e ancestralidade negra, abordando com criticidade e espiritualidade a condição do povo negro pós-abolição. A introdução saúda a princesa Isabel, que tradicionalmente é vista como a "redentora", mas a letra logo desloca o foco dela para os verdadeiros protagonistas da resistência negra, como Zumbi dos Palmares, Zé do Patrocínio entre outras figuras que contribuíram na luta contra a escravidão.

Clara Nunes (1942-1983) - Música “Jogo de Angola



Nasceu em Paraopeba (MG), órfã de pai e mãe aos 6 anos de idade, Clara foi criada pelos irmãos. Aos 14 anos começou a trabalhar em fábricas e mudou-se para Belo Horizonte dois anos depois, onde intercalou o trabalho com a carreira musical. Em 1965 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde lançou seu primeiro LP pela Odeon. No início de sua carreira venceu concursos de canto e se apresentava nas rádios com músicas de estilos diversos, como boleros, samba-canção, bossa nova e da jovem guarda. “Guerreiro de Oxalá”, em 1969, é a primeira música com referência à religião de matriz africana que Clara Nunes grava. Na década de 1970, Clara constrói então uma imagem afro-brasileira com a produção de Adelzon Alves e do estilista carnavalesco Geraldo Sobreira (Matos, Guerra, Ladeira, 2025).

A partir de então, Clara Nunes se consolida no cenário musical brasileiro e difunde sua visão pessoal e sua defesa pela cultura afro-brasileira mesmo sendo uma mulher de pele branca. A cultura afro-brasileira está presente na religião, nas vestimentas, no estilo de vida. Na década de 1970, o programa Fantástico reproduziu por quase dez anos videoclipes da cantora. Para a emissora, os vídeos eram um sucesso de audiência e uma estratégia de conteúdo durante a ditadura, para amenizar o cenário político no horário nobre. Para Clara, essa repercussão era uma forma de estar inserida no mercado da música e, ainda assim, divulgar a cultura afro-brasileira (Coelho, 2023).

A música “Jogo de Angola” interpretada por Clara Nunes narra a história da Capoeira como tática de resistência resgatando a luta corporal dos negros escravizados como símbolo de enfrentamento e preservação cultural. A música pode ser uma reflexão a malandragem e a sobrevivência, “a dança que era festa para o dono da terra/virou a principal defesa do negro na guerra.” A estrutura narrativa da música acompanha o ciclo histórico da escravização e a luta por liberdade utilizando referências culturais afro-brasileiras como berimbau, quilombo e o samba. Clara transforma músicas em ferramenta de memória social e identidade do povo negro no Brasil.

O contexto histórico

As trajetórias artísticas de Maria Aparecida e Clara Nunes são indissociáveis da singularidade de suas expressões na arte e do contexto social e histórico no qual estavam inseridas. Ambas se destacam da e na coletividade promovendo impacto sócio-cultural.

Clara e Aparecida ganham destaque em momentos diferentes, no contexto da Ditadura Militar (1964-1985), onde a censura restringia as produções artísticas da época. Com o processo de redemocratização, iniciado no final da década de 70, período em que o regime militar perdia força, mudanças significativas ocorreram para toda a sociedade brasileira. A partir de então, uma maior liberdade de expressão marcou as produções artísticas o que influenciou fortemente a cultura e a música que era produzida; temas antes censurados, retratando tensões sociais, culturais e políticas, passaram a estar presentes nas composições (Santanna, 2019).

Conclusão


Partindo da análise, nota-se que as raízes ancestrais e o contexto histórico social impactam na música e na formação de artistas. As duas mulheres analisadas, mesmo nascendo em contextos de pobreza e longe da grande capital do Rio de Janeiro, conseguiram trilhar seus caminhos na música, ainda que permeado de lutas e repressão causadas tanto pela configuração política da época, como por abordar questões de cunho racial que vão contra as noções didáticas de história abordadas no período, contribuindo assim de forma grandiosa para a construção do samba.

Bibliografia

COELHO, Renato. “Não temo quebrantos porque eu sou guerreira”: o legado de Clara Nunes. Jornal da Unesp, 28 abr. 2023. Disponível em: https://jornal.unesp.br/2023/04/28/nao-temo-quebrantos-porque-eu-sou-guerreira-o-legado-de-clara-nunes/. Acesso em: 02 jun. 2025.

MATOS, A. M.; GUERRA, I.; LADEIRA, M. C. (Org.) Clara Nunes: eu sou a tal mineira. Belo Horizonte: Fundação Municipal de Cultura: Museu da Moda: Viaduto das Artes, 2025.

SÁ, Marco. Aparecida, a voz dos orixás. 13 maio 2020. Disponível em <https://pitayacultural.com.br/musica/aparecida-a-voz-dos-orixas/>. Acesso: 18 jun. 2025.

SANTANNA, M. O ABC do samba: Alcione, Beth Carvalho e Clara Nunes. In. SANTANNA, M. As bambas do samba – mulher e poder na roda. 2ª ed. Salvador: EDUFBA, 2019. p. 135-158.

A virada do samba - breve história do carnaval de Belo Horizonte

 

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS - UFMG

ESCOLA DE CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO - ECI

CURSO DE GRADUAÇÃO EM MUSEOLOGIA

DISCIPLINA: METODOLOGIA DA PESQUISA HISTÓRICA EM MUSEUS

PROFESSOR: LUIZ HENRIQUE ASSIS GARCIA

GRUPO: JOÃO LUCAS SALGADO MACHADO, SÂMELA CAMPOS MIRANDA ALVES ANDRADE


INTRODUÇÃO

O carnaval de Belo Horizonte tem vivido nas últimas duas décadas um processo de revitalização e de crescimento exponencial. Só no ano de 2025, foram 568 blocos de rua cadastrados para desfilar pelas ruas da cidade, número exorbitante mesmo se comparado ao período áureo carnavalesco do século anterior, que em 1985 contava com cerca de 17 escolas de samba e 23 blocos caricatos (Dias, 2015). Contrariamente, é perceptível que o samba, ritmo essencial do carnaval brasileiro, vem perdendo centralidade na folia belo-horizontina. O presente artigo busca se debruçar nos porquês desse fenômeno.


METODOLOGIA

A pesquisa foi realizada através de leitura bibliográfica e de estudo comparativo entre blocos populares na década de XX e XXI. Para os blocos mais recentes, o levantamento de dados foi feito majoritariamente através da análise das redes sociais dos mesmos, enquanto que para os mais antigos contou-se com informações disponibilizadas pelos sites da prefeitura e do Blocos de Rua, além do material bibliográfico. Buscou-se  analisar tanto perfis de blocos que valorizam o samba como seu ritmo principal quanto aqueles que privilegiam outros ritmos, além do perfil da prefeitura responsável por apurar o crescimento da festa ao longo dos anos. Por meio dessa pesquisa, foram levantadas algumas hipóteses. Em primeiro lugar, como a falta de investimento do Estado poderia ter influenciado a baixa no número de escolas de samba, e como isso resultou na descentralização dos blocos belo-horizontinos, tornando-os nichados e menos dependentes do Carnaval oficial. Em segundo lugar, como a própria indústria musical pode ter influenciado a adição de outros gêneros à folia, e com isso contribuído para a subalternização do samba enquanto ritmo. 


A VIRADA DO SAMBA

Com a elevação do samba enquanto gênero símbolo nacional em 1930, e na tentativa de criar uma Belo Horizonte moderna e progressista, o Estado passa a investir em modelos de celebração bem parecidos com os da então capital do Rio de Janeiro, importando dali os blocos de rua e o modelo das escolas de samba. Surgem aí ritmos e  melodias dos blocos mais populares da época, como também a “Escola de Samba Pedreira Unida” que  foi, provavelmente, a pioneira do carnaval belo-horizontino. Fundada pela comunidade da Pedreira Prado Lopes, desfilou pela primeira vez em 1937. 

Figura 1 – Vídeo do carnaval belo-horizontino de 1964

 


 

https://youtu.be/qUrsN_aZvzs

Fonte: CANAL MIS BH/Reprodução: Youtube


É possível perceber que muitos dos grupos que continuam mantendo o samba como ritmo principal são aqueles ligados aos grupos originais, como é o caso do bloco caricato Aflitos do Anchieta.

Figura 2 – Vídeo de um pós ensaio dos Aflitos do Anchieta, bloco caricato originalmente formado em 1965

https://www.instagram.com/reel/C_OLgguOhh2/

Fonte: Aflitos do Anchieta/Reprodução: Instagram



A partir da ascensão de outros ritmos como o funk e o sertanejo, é possível perceber em blocos mais recentes a tentativa de se mesclar o som tradicional carnavalesco com outros ritmos populares. Essa mescla pode indicar tanto uma tentativa de dialogar com as preferências musicais contemporâneas, ao se aproximar ao desejo da massa, como também enquanto um reflexo direto da lógica da indústria musical, que se adapta sempre visando maximizar o alcance e o lucro. 

Figura 3 – Duda Beat é a convidada do Então, Brilha! do carnaval de 2025

 

 

https://www.instagram.com/p/DGlsnpdS8Ri/

Fonte: Jornal Hoje em Dia/Reprodução: Instagram


O carnaval de Belo Horizonte sobreviveu durante todo o século XX e até cresceu, como no público da “Banda Mole”. Mas se desenvolveu chegando a receber milhões de turistas a partir dos anos 2009.

          Figura 4 - Instagram da Prefeitura de Belo Horizonte sobre o carnaval

 

 


 

https://www.instagram.com/p/DIRWJdhx04G/

Fonte: Prefeitura de Belo Horizonte/Reprodução: Instagram


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Hoje em dia, com as ruas do carnaval de Belo Horizonte tomadas por blocos, “que buscam misturar festa com política, carnaval com revolução, cidade com a mobilização, rua com luta, liberdade com negociação e democracia com amor”(Dias, 2015, p. 117) há também a tentativa da prefeitura de restabelecer alguns padrões para a festa e controlar e enquadrar as manifestações que surgiram de forma espontânea. Para tanto, se preocupa em organizar a festa, mas não em impor qualquer tipo de ritmo ou gênero musical. O grande atrativo do carnaval de rua de Belo Horizonte é justamente a diversidade de ritmos e estilos. Há blocos que tocam axé dos anos 90, outros que fazem versões carnavalescas de rock, blocos infantis, blocos com marchinhas tradicionais e, sim, blocos de samba. Essa pluralidade é vista por muitos como uma riqueza e um reflexo da própria identidade musical da cidade. Já no carnaval oficial, as escolas de samba - que em Belo Horizonte não têm a mesma representatividade que no Rio de Janeiro ou São Paulo, por exemplo -,  como o nome diz, ainda preservam o ritmo e há  valorização de figuras conhecidas de galpões de escolas, o que não acontece com o carnaval de rua, que é a grande vedete da festa em Belo Horizonte. 


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARRUDA, Gabriel. Comunidade Bigode: uma etnografia do samba e do sambista em Belo Horizonte. 2022. Orientador: Eduardo Rosse. 154 f. il. Dissertação (Mestrado em Música) – Escola de Música, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2022.


ANCHIETA, Aflitos do. Depois do ensaio, uma levada de samba pra descontrair. Belo Horizonte, 2025. Instagram: aflitosdoanchieta. Disponível em: https://www.instagram.com/reel/C_OLgguOhh2/. Acesso em: 19 jun. 2025.


CARNAVAL 1964 - Belo Horizonte. Belo Horizonte: Belotur, 2014. Disponível em: https://youtu.be/qUrsN_aZvzs?si=4k3IOwQJG75LVxKI. Acesso em: 22 jun. 2025.


DIA, Jornal Hoje em. Carnaval em BH: Duda Beat é a convidada do bloco então, brilha! para desfile de sábado. 27 fev. 2025. Instagram: jornalhojeemdia. Disponível em: https://www.instagram.com/p/DGlsnpdS8Ri/. Acesso em: 16 jun. 2025.


DIAS, Paola Lisboa Côdo. Sob a “Lente do Espaço Vivido”: a apropriação das ruas pelos blocos de carnaval na Belo Horizonte contemporânea. 2015. 201 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Arquitetura e Urbanismo, Escola de Arquitetura, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2015.


DOMINIQUE, João Paulo Mariano. Insurgências juvenis no carnaval de rua em Belo Horizonte: o bloco seu vizinho e a luta pela afirmação do território. 2019. 200 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2019. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/38166/4/Disserta%c3%a7%c3%a3o_Jo%c3%a3o_P_M_Domingues_Biblioteca%2c%202019..pdf Acesso em 20 jun. 2025.


HORIZONTE, Carnaval de Belo. #TBT daquele Carnaval que deixou saudade no coração e orgulho na memória. 10 abr. 2025. Instagram: carnavaldebh. Disponível em: https://www.instagram.com/reel/DIRWJdhx04G/. Acesso em: 20 jun. 2025.


TEM, Santa Tereza. Os Inocentes nos “Outros Carnavais”, Santa Tereza tem. Disponível em: https://santaterezatem.com.br/2019/03/24/os-inocentes-nos-outros-carnavais/. Acesso em: 20 jun. 2025.

Coletividade e samba de terreiro


 

Universidade Federal de Minas Gerais
Curso de Graduação em Museologia
Disciplina: Metodologia da Pesquisa Histórica em Museus
Docente: Luiz Henrique Assis Garcia

Discentes: Aparecida Millena Rocha, Kamila Ferreira da Silva, Monaliza Melo, Sofia de Carvalho, Vitor Santos.



Fig. 1: Terreiro N’zo Kabila. Crédito: Kamila Ferreira.


Ao explorar os diferentes sentidos e significados do samba, passamos a entendê-lo como algo abrangente e amplo, que além de um gênero musical, pode também ser entendido como uma manifestação religiosa e de resistência. Estando presente de forma mais latente nas religiões brasileiras de matrizes africanas, vemos que o samba desenvolve um papel primordial que, para além de um ritmo que faz parte de rituais, também se entrelaça com a construção de identidades, de formas estéticas e de coletividades. A partir disso, o presente texto busca explorar as diversas reverberações do samba de terreiro, investigando as relações, vivências e processos de permanência. Pretende-se abordar nesse recorte as relações desenvolvidas nesse ambiente e como o samba é entendido como instrumento para permanência dos grupos abordados.

Para desenvolvimento da pesquisa, primeiro foram levantadas as fontes que estavam disponíveis on-line. Foram encontrados alguns textos sobre a temática, além do canal “CAMILO GAN OFICIAL”, do pesquisador e sambista Fabiano Paula Camilo, com material valioso, como o “Samba de Terreiro - Palestra Sambada”, onde o mesmo explorava vários tipos de samba diferentes e seus significados e “Festival Samba de Terreiro - Conversa de Sambadeira”, em que várias mulheres que tem relação como samba e terreiro conversam de forma livre sobre suas vivências. Após isso, foi usado muito das informações conseguidas durante as entrevistas e pesquisas de campo realizadas para a exposição. Alessandra e Mãe/Rainha Belinha foram entrevistadas em seus próprios terreiros, Ilê Ase Sapponon e N’zo Kabila, e também foi realizada uma conversa com Ekedi Kely, que colaboraram para nosso entendimento sobre o samba como instrumento de cura e parte da identidade dessas comunidades e espaços.

Alessandra aponta, como parte de sua fala, que as narrativas presentes nas letras das composições do samba de terreiro carregam em si, de forma lúdica, diversos princípios e conceitos que fazem parte da raíz dos terreiros de candomblé:


“Fazer samba é contar histórias sob uma ótica que vai além da dor e do sofrimento do povo negro — é também narrar suas memórias, experiências de resistências e afetos. Trata-se de um “estar junto” — um compartilhar — envolto na alegria característica do povo negro, onde o samba se conecta ao divino, ao sagrado do Candomblé. É esse o Samba de Terreiro, o Samba de Entidade, o Samba de Caboclo.”


A partir dessa reflexão, evidencia-se o samba como algo fundamental e indissociável da própria prática do terreiro, que age como forma de transmissão dos ensinamentos e tradições associadas ao sagrado, ocupando o papel um agente de construção de indivíduos e de relações entre eles, criando assim relações de territorialidade e pertencimento dentro desse espaço. Visto isso, como argumentam Nigri e Debortoli, os diversos elementos que rodeiam o universo do samba de terreiro e do candomblé, como a musicalidade, rituais e as relações estabelecidas ali dentro “[...] não possuem sentidos somente em si mesmos, fragmentados do contexto como é possível observar em práticas de sociedades que se constituem a partir de uma orientação ocidental”.

Diante do exposto, compreende-se que o samba de terreiro é muito mais do que uma expressão musical, trata-se de uma prática profundamente enraizada nas vivências, afetos e espiritualidades das comunidades de terreiro. Atuando como instrumento de resistência, cura e transmissão de saberes, o samba reafirma identidades, fortalece laços coletivos e conecta o sagrado ao cotidiano. Assim, reconhecê-lo em sua complexidade é também valorizar os territórios simbólicos e culturais das religiões de matriz africana e das histórias que sustentam sua permanência.



Fig. 2: Terreiro Ilê Ase Sapponon. Crédito: Eduardo Queiroga.


Referências:

CAMILO GAN OFICIAL. Canal de Fabiano Paula Camilo. YouTube, [s.l.], [s.d.]. Disponível em: https://www.youtube.com/c/camilogan. Acesso em: 22 maio 2025.

FESTIVAL Samba de Terreiro - Conversa de Sambadeira. Produção: Camilo Gan Oficial. Brasil: YouTube, 2021. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=jg1zGQcKOD0. Acesso em: 22 jun. 2025.

NIGRI, Bruno Silva; DEBORTOLI, José Alfredo Oliveira. O samba no contexto do candomblé: festa, mito e religiosidade como experiência de lazer. Licere, Belo Horizonte, v. 18, n. 3, set/2015, p. 276-290.

SAMBA de Terreiro - Palestra Sambada. Produção: Camilo Gan Oficial. Brasil: YouTube, 2021. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=eHeo37-oLFc. Acesso em: 22 jun. 2025.




















As Escolas e a institucionalização do samba

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
ESCOLA DE CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
BACHARELADO EM MUSEOLOGIA
DISCIPLINA METODOLOGIA DA PESQUISA HISTÓRICA EM MUSEUS
DOCENTE: Luiz Henrique Assis Garcia
DISCENTES: Ana Clara Marques, Ana Clara Rios,Camila Amanda, Geovana De Souza, Luciana Almeida e Marcella Joana.



Vinícius de Moraes, um dos entusiastas da música e literatura brasileira, afirma: “O samba é a expressão mais sincera da alma brasileira, onde o povo transforma dor em alegria e resistência em arte”. Entretanto, o antropólogo e pesquisador Hermano Vianna (1960), em seu livro intitulado O Mistério do Samba, aponta que o processo de institucionalização do samba ocorreu por meio da organização dos chamados ranchos carnavalescos. Eles foram os primeiros grupos legalizados do samba, sendo criado e sediado na cidade do Rio de Janeiro, em meados do século XIX e início do século XX. O fato evidencia o quanto esse ritmo se fez através da comunidade, tornando-se não somente um ritmo ou uma prática, mas também, uma linguagem e um saber fazer carregado de memórias que permeiam a construção da identidade do Brasil.

A institucionalização do samba também passou pela fundação das Escolas de Samba, cujo papel foi moldado não somente como espaço de aprendizagem das singularidades do samba, mas também como um agente fomentador de produção cultural, de troca de conhecimentos e histórias. O próprio termo “escola de samba”, foi pronunciado primeiramente por Ismael Silva, fundador do Rancho Deixa Falar, que afirmava: “Nós somos os professores do samba” e também que “não somos um bloco qualquer, somos a escola de samba“, destacando o papel pedagógico e cultural dessa manifestação.


Vídeo 1 - Ismael Silva fala sobre o Samba (1977)




Nesse sentido, como espaço de fortalecimento de laços comunitários, surge a Escola de Samba Cidade Jardim, criada em 13 de abril de 1961, como dissidente da União Serrana. Sua participação ao longo dos seus 64 anos de existência, contou com enredos marcantes como o “As grandes Festanças das Gerais” em 1983, que lhe valeu o título de campeã e o “Cidade Jardim Canta as Flores” em 2018, que utilizou as flores como metáfora para a diversidade e a riqueza cultural no Brasil, além de ressaltar a conexão entre a natureza e a identidade nacional, mostrando como as flores estão presentes em festas, rituais e manifestações artísticas.


Vídeo 2 - História da Escola de samba cidade jardim e objetivos.




As Escolas de Samba, como destaca o atual presidente da Escola de Samba Cidade Jardim, Alexandre Silva Costa, durante entrevista realizada pelo grupo em abril (2025), são lembradas “apenas no carnaval”, período cuja efervescência não permite ver que antes do ápice da festa, houve tanto trabalho e inúmeras mãos participando para que o espetáculo ocorresse, e mais que isso, que o espaço na qual foi produzido o enredo carrega muito mais que tamborins, enfeites, adereços, purpurinas e grandes carros alegóricos; carrega em seu aspecto social a transformação daqueles que estão á sua volta.

Ao longo do ano, oficinas de balé, capoeira, percussão e tantas outras atividades proporcionam momentos de interação e identificação social, mostrando que as identidades culturais não são construídas de forma isolada, mas sim dentro de um contexto social e material, em constante interação entre indivíduos e lugares.




Figura 1 - Mosaico de fotos retiradas durante a entrevista com o Presidente da Escola de Samba Cidade Jardim Alexandre Silva na própria Sede.

Fonte: Acervo pessoal do grupo

Em suma, a valorização do Samba também foi impulsionada por intelectuais e músicos que buscavam legitimar essa expressão como parte da identidade nacional autêntica. Cantores como: Pixinguinha, Clara Nunes e Gonzaguinha, tiveram papel fundamental na difusão do samba para novos públicos. Além deles, figuras como Dona Jandira e Dona Elisa representam a força e a tradição do samba. A presença delas no cenário mineiro reforça a importância do samba como um patrimônio vivo que atravessa gerações e continua a inspirar novas histórias. Na ocasião, a história de Dona Elisa, a matriarca do samba, foi a abertura da exposição PRETAgonistas, exposição concebida pelos estudantes do 6º período do curso de Museologia da UFMG em junho deste ano (2025).


Vídeo 3 - História de Dona Elisa ,a matriarca do samba, na abertura da exposição PRETAgonistas.




Decerto, o samba é muito mais do que um ritmo ou uma dança: ele é um espaço de sociabilidade, onde se fortalecem os laços comunitários e se compartilham histórias e saberes. É nas rodas, nas festas e nas escolas de samba que o samba se mantém vivo, atravessando gerações e reafirmando a identidade cultural do Brasil. Reconhecer o samba como essa prática social é valorizar sua força de transformação e a importância de preservar essa memória que tanto inspira e conecta as pessoas.


REFERÊNCIAS

AUGRAS, Monique.O Brasil do samba-enredo.Rio de Janeiro Editora Fundação Getúlio Vargas 1998,p.15-25 ;p.107-199.

LIMA, Paulo. O Samba é a Alma do Povo. Portal Conteúdo Aberto, 2025. Disponível em: https://portalconteudoaberto.com.br/clique-literario/colocando-em-pratica/o-samba-e-a-alma-do-povo/. Acesso em: 23 jun. 2025.

LOPES, N. SIMAS, Luiz Antônio. Dicionário da História Social do Samba. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015.

VIANNA, Hermano. O mistério do samba. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. [1. ed. – 1995].