quinta-feira, 25 de março de 2021

RESSONÂNCIAS DO PRESÉPIO DO PIPIRIPAU EM TEMPOS DE ISOLAMENTO SOCIAL - Função Social dos Museus 2020

Universidade Federal de Minas Gerais

Escola de Ciência da Informação – Graduação em Museologia

Disciplina: Função Social dos Museus - Atividade: Trabalho Final

Professor: Luiz Henrique  Assis
Garcia

Autoras: Anna Carolina Dias, Camila Pinho, Carolina Teixeira, Cristiane Lei, Fernanda Junqueira, Ingrid Fonseca, Núbia Gonçalves e Victória Brandão.

RESSONÂNCIAS DO PRESÉPIO DO PIPIRIPAU EM TEMPOS DE ISOLAMENTO SOCIAL


“O Presépio do Pipiripau é uma obra em processo”

André Silva - Museólogo do MHNJB-UFMG

O Presépio do Pipiripau é uma obra representativa da arte popular de Minas Gerais e até hoje marca não só a infância, mas a vida dos moradores da capital. A obra, que apresenta 45 cenas, 580 figuras dispostas em um cenário de cinco planos que se relacionam com uma rampa ascensional em um espaço de 20m² dentro do Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG, destaca-se porque além de ser uma representação bíblica é também uma autobiografia da vida que Raimundo Machado de Azevedo viveu durante a transformação do Curral del Rey na capital de Minas Gerais e como era a vida daqueles que vieram para construí-la.

No período de duas semanas em dezembro de 2020, durante a pandemia da COVID-19, o MHNJB-UFMG tomou a decisão de reabrir a exposição do Presépio, com medidas mais restritivas, seguindo as orientações de segurança da OMS, a pedido do público e iniciativa dos próprios funcionários. Com isso, o objetivo do trabalho foi entender as relações do público que visita e visitou o espaço, quais são suas memórias afetivas e os níveis de pertencimento que criaram com o patrimônio.

 

Aline leva seu filho para conhecer o Presépio, como sua mãe havia feito com ela. [Foto das autoras]

A nossa intervenção se deu por meio da busca por relatos sensíveis, a partir de entrevistas com visitantes neste período de reabertura e em períodos prévios; conversa sobre a temática e sobre as ações do Museu com o museólogo do MHNJB-UFMG, André Leandro Silva; e elaboração de um vídeo apresentando os objetivos do trabalho, os relatos obtidos e as informações que conseguimos reunir sobre a obra e o espaço em que está localizada. 
 

Marcus Vinícius entende a obra como uma arte para além da religiosidade. [Foto das autoras]

Na história da Museologia, a partir dos anos 1970, buscou-se compreender mais sobre a cultura como criadora das condições necessárias para o desenvolvimento e a preservação cultural como fator indispensável à qualidade de vida. Desde então, transformações necessárias foram propostas, como a aproximação dos interesses e a acessibilidade do público. O museu seria, então, um intermediário, onde as contribuições culturais da comunidade são expostas e compreendidas.

Preservar, expor e comunicar é também trabalhar um instrumento de cidadania, um ato transformador capaz de proporcionar a apropriação plena do bem pelos indivíduos num processo de continuidade, onde eles encontram traços da sua cultura, do seu fazer do dia-a-dia, se identificando como aquele que participa da História, pois como dizia Waldisa Russio (1977 apud BRUNO et al, 2000, p.159): “O museu não existe isoladamente, mas dinamicamente, na sociedade.” 

Seu Raimundo montou um Presépio com o que sobrava da cidade. O Pipiripau evoca memórias da jovem capital de Minas Gerais. Hoje, como patrimônio reconhecido da cidade de Belo Horizonte, ele ajuda a conhecer, em sua história, a cultura popular, a religiosidade e os sujeitos históricos muitas vezes não visibilizados em livros de história e museus. A obra dá conta da diversidade de uma cidade que mesmo trazendo um discurso de modernidade mantinha a vocação conservadora de segregar aqueles que estavam fora dos limites da avenida do contorno. 


Raimundo Machado idealizou e esteve à frente da construção do Pipiripau por 82 anos.

Fonte: https://www.ufmg.br/90anos/o-vasto-mundo-de-raimundo/

Para além de um espetáculo para ser oferecido a um estranho, a obra é uma manifestação na terceira pessoa, é um ente querido incorporado à cidade. Ele articula com surpreendente criatividade a fé, o fazer e o conceber da história de BH e do próprio processo de modernização tecnológica dos materiais e das mentalidades.

O Presépio do Pipiripau, bem como sua relação com o local em que está abrigado provoca reflexão e encontro com a cultura da comunidade no entorno. Ao analisar o que foi pesquisado e discutido nas entrevistas e no trabalho no geral, percebemos que ele possui elementos que tocam a memória dos visitantes, seja remetendo à sua religião, ao local onde vivem, aos ofícios de sua família e histórias com as quais o público rapidamente se identifica. Esse conjunto de aspectos o torna único e memorável e o faz ser visitado por centenas de famílias todos os anos, como uma forma de tradição. Esse hábito de lazer cria laços afetivos e atribui a ele um valor simbólico inestimável.

A ação de abertura, a partir de um diálogo com demandas da população, em um mês de festividades católicas - ainda que o bem também extrapole essa significação religiosa -, nos mostra como a função social dos museus passa pela difusão do acesso à memória. Os desafios da participação mais ampla e contundente por parte dos atores sociais está na forma de como oportunizar essa inclusão que aqui foi feita a partir da escuta sensível do público e de suas necessidades.


REFERÊNCIAS:

BRUNO, M. C. O., FONSECA, Andrea M., NEVES, K. R. F. Mudança social e desenvolvimento no pensamento da museóloga Waldisa Rússio Camargo Guarnieri: textos e contextos. In: BRUNO, M. C. O (org.). Waldisa Rússio Camargo Guarnieri : textos e contextos de uma trajetória profissional. Vol. 2. São Paulo : Pinacoteca do Estado : Secretaria de Estado da Cultura : Comitê Brasileiro do Conselho Internacional de Museus, 2010. MOUTINHO, M. Sobre o conceito de museologia social. Cadernos de Sociomuseologia Centro de Estudos de Sociomuseologia, América do Norte, 1, Mai. 2009.

O PRESÉPIO DO PIPIRIPAU E SEU PÚBLICO. Disponível em: <https://youtu.be/fRQqtfGd1RI>. 13:05 min. jan. 2021.


2 comentários:

  1. Faço parte dessa comunidade que conheceu o presépio na infância, levada por minha mãe, visitou-o novamente com o namorado (agora marido) e amigos e, mais recentemente com um novo olhar trazido pela museologia.
    Parabéns ao grupo pelo trabalho!

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